sexta-feira, 13 de maio de 2011


Anistia Internacional denuncia Brasil marcado por desigualdades e violência

Relatório da entidade de direitos humanos ressalta o alto índice de mortes cometidas por policiais e a forte atuação das milícias nas grandes cidades brasileiras: velhos problemas não resolvidos.


Polícia matou 855 pessoas em 2010 alegando resistência ao Estado'
Os altos índices de violência, a atuação das milícias policiais e as péssimas condições nos presídios são os principais alvos das críticas ao Brasil, feitas pela Anistia Internacional, em seu relatório anual sobre direitos humanos divulgado nesta sexta-feira (13/05).

Segundo a Organização Não-Governamental, a violência causada tanto por criminosos quanto por policiais continuam representando "o maior problema das grandes cidades brasileiras". As comunidades mais carentes, especialmente os moradores das favelas, continuam sendo as principais vítimas do descaso das autoridades, sobretudo no que se refere ao direito à moradia e acesso a serviços básicos.

O relatório destaca ainda que no último ano do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva o Brasil registrou crescimento econômico, estabilidade política e uma boa posição no campo internacional. No entanto, ressalta o balanço, a "enorme desigualdade" ainda persiste, apesar dos progressos obtidos na luta contra a pobreza.

Violência policial

Os dados divulgados pela Anistia Internacional referem-se ao ano passado e revelam que, de janeiro a dezembro, a polícia brasileira matou 855 pessoas em situações descritas como "resistência ao poder estatal". Os chamados "esquadrões de morte", formados por policiais e autoridades de segurança fora de serviço, permaneceram ativos em várias cidades.

Enquanto em alguns estados brasileiros o número total de homicídios chegou a cair, o índice de violência envolvendo polícia e gangues aumentou. A ONG cita que mais de 50 pessoas foram mortas em apenas uma semana durante ações policiais desencadeadas a partir de novembro, em retaliação a bandidos que atacaram delegacias e chegaram a queimar 150 veículos no Rio de Janeiro.

A entrada de aproximadamente 2,6 mil policiais, com apoio do Exército e até da Marinha brasileiras, no Complexo do Alemão para a instalação de uma Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) também é destaque no relatório. Até então, diz o documento, "o local era disputado pelos maiores grupos de traficantes rivais". Ainda de acordo com a Anistia Internacional, as UPPs – em funcionamento desde 2008 – ajudaram a reduzir a violência nos locais onde foram instaladas.

Torturas nas prisões

Cadeias apertadas, presos depositados em espaços sem as mínimas condições higiênicas, sob condições desumanas – assim a Anistia descreve os sistema carcerário brasileiro.

"As autoridades perderam o controle sobre muitas instituições, o que levou a vários motins e homicídios", completa. Entre os exemplos citados no relatório está o assassinato de 18 presos em duas rebeliões ocorridas no Maranhão entre gangues rivais – sendo que quatro foram decapitados.

Segundo a ONG, a tortura em prisões, em celas de delegacias e em centros de detenções de menores aumentou bastante no ano passado. No final do ano, porém, a Casa Civil teria ficado de analisar uma proposta de lei para introduzir medidas preventivas contra a tortura, seguindo um protocolo estabelecido por uma Convenção das Nações Unidas e ratificado pelo Brasil em 2007.

Catástrofes e falta de moradia

O direito à moradia também vem sendo fortemente infringido no Brasil, revelou o levantamento da Anistia Internacional. Alagamentos em São Paulo, Rio de Janeiro, Alagoas e Pernambuco levaram a centenas de mortes na primeira metade do ano passado, e pelo menos 10 mil pessoas ficaram desabrigadas.

A entidade denuncia o descaso das autoridades com os moradores do Morro do Bumba, no Rio de Janeiro, que veio abaixo após fortes chuvas na cidade, matando mais de 100 pessoas. A favela havia sido erguida sobre uma montanha de lixo e oferecia sérios riscos aos moradores, devido à contaminação tóxica e à instabilidade do solo, detalhados em um estudo da Universidade Federal Fluminense de 2004.

Nada, porém, foi feito no sentido de reduzir os riscos ou transferir a comunidade de local. Para piorar a situação, até o final do ano passado os flagelados continuavam em abrigos provisórios instalados em antigos quartéis militares, em péssimas condições, aguardando alguma solução por parte do governo do estado.

Algumas comunidades também revelaram à entidade estarem sendo ameaçadas de despejo, devido às obras relativas à infraestrutura necessária para a Copa de 2014 e às Olimpíadas de 2016.

Impunidades

A Anistia ressalta que, no ano passado, índios brasileiros que lutam pelos direitos estabelecidos em lei foram vítimas de discriminação, intimidação e violência. Caso mais emblemático é a briga pelo reconhecimento dos direitos da comunidade Guarani Kaiowá pelo direito à terra no Mato Grosso do Sul. Os índios vêm sendo frequentemente ameaçados e atacados por seguranças armados, contratados pelos fazendeiros da região.
As condições de trabalho no Brasil, de maneira geral, são más, segundo o relatório. Trabalhadores rurais, especialmente na pecuária e nas plantações de cana-de-açúcar, são os que mais têm seus diretos violados. A Anistia também critica neste ponto a demora do Congresso brasileiro em votar importantes mudanças na Constituição, sugeridas em 1999 para melhorar as condições dos trabalhadores.

A entidade aponta dificuldades no Brasil na defesa dos direitos humanos e em superar a impunidade no país. "Na América Latina, o Brasil continua em último lugar no que diz respeito a uma elaboração adequada das graves violações dos direitos humanos cometidas durante o regime militar", aponta o relatório, ressaltando que muitos responsáveis por torturas, estupros e desaparecimentos durante os anos de chumbo (1964-85) até hoje não foram devidamente punidos.

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